Reconhecido por inserir a
capital do Brasil no circuito internacional de artes visuais, o Museu Nacional da República exibe, a partir de 25 de
junho, exposições simultâneas de Farnese de Andrade e Thiago
Martins de Melo. Com curadoria de Denise Mattar,
ambas resultam da parceria entre o Museu brasiliense
com as galerias paulistanas Almeida e Dale e Leme/AD.
A iniciativa faz parte de um projeto itinerante das Galerias, que visa a levar
mostras de artistas renomados para diferentes regiões do País.
"É com muita satisfação que
os levamos [Farnese e Martins de Melo] ao público brasiliense. São artistas de
gerações e linguagens diferentes, mas igualmente importantes para história da
arte brasileira", afirma Antonio Almeida, sócio-diretor da Galeria Almeida
e Dale. "Essa itinerância fortalece nosso compromisso de democratizar o
acesso e a democratização da cultura", completa Eduardo Leme,
sócio-fundador da Galeria Leme/AD.
Farnese de Andrade
Figura de singular trajetória nas artes plásticas brasileiras, Farnese de Andrade é autor de uma obra potente, que toma o observador por sua força e fragilidade, ao mesmo tempo em que o perturba com certa morbidez. Reunindo obras de coleções particulares do Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais e Pernambuco, a exposição Farnese de Andrade – Memórias Imaginadas oferece ao público uma rara oportunidade para a apreciação de um conjunto integral da obra do artista. São mais de 100 trabalhos, entre pinturas, desenhos, gravuras e objetos que possibilitam um mergulho em seu mundo de fantasias construídas.
"Sua gravura é plena de
texturas, cortes abruptos e contrastes de luz e sombra. Sem tirar a pena do
papel, realizava compulsivamente os nanquins intitulados Obsessivos,
de quase inacreditável precisão", afirma Denise Mattar. Para realizar seus
desenhos em cores, Farnese desenvolveu ainda uma técnica refinada que chamava
de "tinta transformada", com um resultado que os aproxima da pintura.
"São trabalhos densos, ambíguos, permeados por uma sensualidade perversa e
imersos numa sufocante ourivesaria visual", completa a curadora.
Em 1964, o artista, que já era
reconhecido e premiado pela qualidade de seus desenhos e gravuras, passa a
desenvolver trabalhos aos quais chama de "impressão manual de
formas", técnica que consistia na criação de carimbos confeccionados a
partir de madeiras carcomidas, sandálias velhas e apetrechos curtidos pelo sol
e pelo sal, devolvidos pelo mar. A pesquisa desses materiais, até então
utilizados como matrizes para a criação de gravuras singulares, acaba por
conduzir Farnese a seus objetos.
O artista passa, então, a
coletar fragmentos vários, encontrados num primeiro momento na praia e,
posteriormente, comprados numa espécie de compulsão. Arrebatado por uma ânsia
por capturar sua própria história e mergulhar em suas memórias imaginadas,
aprisiona tudo aquilo que é coletado em caixas, gavetas, oratórios e semelhantes,
criando assemblages que nunca são dadas por terminadas -
processo interrompido apenas com venda das peças, o que o artista fazia a
contragosto, recomprando-as por vezes.
"As assemblages de
Farnese tratam de questões como a memória, o tempo, a vida e a morte, o
masculino e o feminino, o pecado e o castigo. São combinações antagônicas de
segredos e revelações, medo e malícia, delicadeza e crueldade. Ao mesmo tempo
em que a finitude humana é escancarada por bonecas fragmentadas e cabeças
suspensas no ar, a religião é questionada quando faz uso de ex-votos e santos
paralisados, cortados, virados de ponta cabeça.", diz a curadora.
A exposição apresentada no Museu Nacional da República lança luz às várias facetas desta produção
singular, comparável à de artistas surrealistas como o alemão Hans Bellmer e o
americano Joseph Cornell. São trabalhos de séries emblemáticas, realizadas
entre 1966 e 1996, entre as quais O Anjo Louco (1986), Olímpica (1996)
e Sebastião (1978/81).
"[Farnese] usa oratórios,
caixas e gamelas como continentes de uma turbulência mental mórbida, cujo grito
sai abafado. São trabalhos potentes, mas claustrofóbicos, que remexem sem dó
nas entranhas do inconsciente e, por isso, fascinam, encantam, assustam e
incomodam", afirma Denise Mattar.
Thiago Martins de Melo
O cruzamento caótico de personagens e situações da história passada e presente do Brasil, pinçadas pelo olhar indignado e sarcástico deThiago Martins de Melo, é o foco da mostra Necrobrasiliana, exibida a partir de 25 de junho, no Museu Nacional da República.
O neologismo que dá título à
exposição associa o termo necro, que em grego significa morto,
à palavra Brasiliana, que designa uma coleção de obras artísticas
ou científicas tendo o nosso País como tema, e também à necropolítica,
conceito criado pelo sociólogo camaronês Achille Mbembe, enfatizando que o
poder dominante é sempre o responsável por ditar as regras de quem deve viver
ou morrer.
A partir desse ponto de vista, o
artista maranhense reflete sobre os legados históricos do Brasil, mostrando
como a morte, a injustiça e a violência são exercidas há quinhentos anos sobre
os mais fracos e como essa mesma arbitrariedade se desdobra no presente.
Aludindo à avalanche de
informações da era contemporânea, Thiago Martins Melo extrapola a bidimensionalidade
da tela e cria pinturas densas, formadas por diversas camadas, às quais também
sobrepõe outros tipos de materiais. Suas crônicas exaltadas são potencializadas
nas telas de grande formato, que mais parecem muros pelo uso deliberadamente excessivo
da tinta.
Nelas se mesclam imagens
emblemáticas da iconografia brasilianista, como os índios de Eckhout, Theodore
de Bry e Debret, com outras imagens igualmente emblemáticas de um passado
recente, a exemplo do retrato de Marighela, o carnaval proibido de Joãozinho
Trinta, o rosto de Luzia [fóssil humano mais antigo encontrado na América do
Sul] ou, ainda mais atuais, as manifestações de 2013 e a truculência da
polícia. Resistências e decadências, simbologias e personagens, espiritualidade
e sincretismo se engalfinham nesses muros assombrosos.
"Sejam esculturas,
instalações, vídeos ou pinturas, as obras de Thiago Martins de Melo se
constroem no excesso, em camadas de imagens intensas, sempre conectadas ao
extermínio e às problemáticas enfrentadas pelas minorias. Por isso, seu
trabalho causa impacto, não apenas pelas grandes dimensões e temas retratados,
mas, também, por sua exuberância formal" - afirma Denise Mattar.
SERVIÇO
Farnese de Andrade – Memórias Imaginadas
Necrobrasiliana, de Thiago Martins de Melo
Local: Museu Nacional da República
Endereço: Lote 02, SCTS próximo à Rodoviária do Plano Piloto, Brasília - DF
Abertura: 25 de junho, terça-feira, a partir das 19h
Período expositivo: de 25 de junho a 4 de agosto
Visitação: de terça-feira a domingo, das 9h às 18h30
Telefone: (61) 3325-5220
Entrada gratuita
*Foto de Sérgio Guerini - Legenda: Sem título, 1986/92, Farnese de Andrade. *Foto de Filipe Berndt - Legenda: Tempo e sol de Luzia, 2019, Thiago Martins de Melo.
Fonte: Assessoria de Imprensa
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